Olá amigas e amigos,
Bem-vindas e bem-vindos à πολύτροπον (diz-se polítropon) - a minha carta semanal "de muitos caminhos".
A nossa jornada, nesta semana, leva-nos por caminhos perigosos e difíceis em França, pela perda de alguém eterno, a felicidade de um novo livro num outro continente e a oportunidade de novos encontros lisboetas, portuenses e quem mais vier.
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— E… No final da carta, partilho excertos de um ensaio publicado na Revista do Expresso que explica o nome desta carta (o primeiro adjetivo que Homero usa para descrever Ulisses na Odisseia).
Ah! Recordo que πολύτροπον (diz-se polítropon) - "de muitos caminhos" é inteiramente gratuita.
(Quem não quiser receber este email, é só clicar em "unsubcribe" abaixo, ou enviar mensagem solicitando a retirada da minha lista de contactos.)
Rui
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A França frente-a-frente
Aquilo de que os seus críticos atacam a Nova Frente Popular — ou seja, o facto de ser uma coligação muito eclética, de comunistas a economistas e socialistas, passando pela “França Insubmissa” de Jean-Luc Mélenchon — é, na verdade, a razão de ser da sua força. Ou pelo menos essas diferenças ficam atenuadas pela distância que vai entre a visão de uma França democrática e plural, com as suas raízes na Resistência e na Libertação do pós-IIª Guerra Mundial, e a de uma França revanchista e fechada, representada pelos herdeiros da Frente Nacional fundada por colaboracionistas e saudosistas do regime de Vichy. E de qualquer forma o ecletismo da Nova Frente Popular é o menor dos problemas agora, porque bem maior terá de ser o ecletismo necessário para ter uma maioria de governo, caso se consiga impedir que a União Nacional de Le Pen tenha uma maioria absoluta. Nesse caso, a única hipótese de governo minimamente viável terá de passar por um entendimento entre a Nova Frente Popular, de esquerda, e os restantes grupos democráticos, incluindo os deputados próximos do Presidente Macron, naquilo que terá de ser uma autêntica Frente Republicana. Para que isso aconteça, o exemplo da Frente Popular original é ainda o melhor guia. É o foco no bem estar das pessoas, na qualidade de vida e na capacidade dos empregados e trabalhadores terem rendimento suficiente para terem uma vida digna e confortável que terão de estar os objetivos que permitirão afastar a França do abismo de um colapso do estado de direito, da democracia e dos direitos fundamentais!
Leiam a crónica completa no Expresso desta semana.
Adeus sentido
O Fausto Bordalo Dias não foi só dos melhores compositores e autores da nossa música popular. Deixou-nos a que é provavelmente a obra-prima dela, Por Este Rio Acima.
Como muitos outros, cresci a ouvir aquele disco duplo, e ainda sei acompanhá-lo cantando do princípio ao fim. Obrigado Fausto, seguirás vivo enquanto lembrado e cantado.
Finalmente, finalmente e mais finalmente
Saiu a edição brasileira de «Agora, agora e mais agora». O lançamento foi no passado domingo, na Feira do Livro do Pacaembu, em São Paulo, com a incrível Sofia Nestrovski.
Sim, Le Pen pode ganhar
Em 2017, escrevi uma crónica para o Público sobre as eleições francesas. Naquele ano, Emmanuel Macron venceu com 65% dos votos, tendo Marine Le Pen ficado em segundo lugar. Apenas sete anos foram suficientes para uma transformação radical no panorama político da França. Desta vez, Le Pen triunfou, enquanto Macron fica em terceiro lugar. Le Pen já ganhou politicamente tanto em 2017 como em 2024, mas como em 2017, em 2024 é possível derrotar nas urnas a extrema-direita.
Marine Le Pen não tem forçosamente de chegar a Presidente para ganhar: o seu objetivo é dominar a política francesa nos próximos anos. E para tal é evidentemente diferente ser derrotada por 80 contra 20 por cento, como o seu pai, ou poder ficar acima dos 40 por cento como agora parece possível. Se isso acontecer, a Frente Nacional pode passar a ser, para todos os efeitos práticos, a oposição em França.
Confesso que nunca imaginei que ela fosse ser objetivamente ajudada nesse desígnio — custa escrever isto — por Jean-Luc Mélenchon. Não só porque sempre acreditei que o núcleo da ideologia de Mélenchon fosse o republicanismo e não o sectarismo de esquerda, mas também porque a esquerda será a maior prejudicada por um resultado que parta a França em duas metades quase iguais de que a esquerda não faça parte.
A estratégia de Marine Le Pen foi sempre a de normalizar a Frente Nacional, “desdiabolizá-la”, como se diz em França. Pois bem, não só ela teve sucesso nessa estratégia como ainda lhe saiu um brinde em troca: a diabolização de Macron.
Podem ler a crónica completa em “Sim, Le Pen pode ganhar”
1º Encontro de Autarcas do LIVRE
Amanhã, o Porto acolhe os autarcas do LIVRE para uma conversa e esclarecimentos de como funcionam as instituições que moldam a maneira de como vivemos a cidade e na cidade.
Se estiverem pelo Porto, apareçam pelas 14h, na nova sede do LIVRE no Porto, na Rua dos Bragas, nº 85.
E… tenham um bom fim-de-semana!
Leituras da semana
How the Libertarian Party Lost Its Way — Liz Wolfe
Semana de 4 dias é (afinal) boa para a saúde mental dos trabalhadores e não prejudica as empresas — João Maldonado e Rodrigo Rimourinho
O imigrante-emigrante que coleciona fragmentos do mundo — Safaa Dib
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Telegram
É por aqui o meu canal no Telegram: https://t.me/ruitavarespt . Vemo-nos por lá!
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Fala-me, ó musa, de um homem problemático
Sobre Emily Wilson, a mulher que se aventurou a ser a primeira a traduzir a Odisseia para inglês e o tipo de homens que se escandalizam com isso.
Mas vamos lá: chamar “complicado” a Ulisses é ou não ofensivo? E se fosse? É que a pergunta deve ir um pouco mais atrás: quem diz que é apenas suposto elogiar Ulisses na primeira linha da “Odisseia”?
Vamos à palavra tal como Homero, ou talvez “Homero”, a talvez disse primeiro e ele ou outro a escreveu depois, há cerca de entre 3000 e 2600 anos. A palavra — o primeiro adjetivo usado para descrever Ulisses na Odisseia é πολύτροπον, que se pode transcrever como “polítropon”, um acusativo de “πολύτροπος” (polítropos), para modificar o substantivo ἄνδρα, homem. Polítropon não é complicado de explicar: “poli-” quer dizer “muitos” e “tropos” que dizer “caminhos”, pelo que “polítropon” se poderia traduzir literalmente como “de muitos caminhos”. “Do homem conta-me, ó Musa, de muito caminhos” seria a tradução literal das primeiras palavras da “Odisseia”.
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