Olá amigas e amigos,
Bem-vindas e bem-vindos a πολύτροπον (diz-se polítropon) - a minha carta semanal "de muitos caminhos".
Nesta carta veremos como o cerco se fecha e os autoritários avançam rápido. Na Hungria as manifestações de apoio à comunidade LGBTQIA+ estão proibidas e os manifestantes serão identificados — e fichados — por reconhecimento facial. Também iremos até ao ano de 1816, dar Tempo ao Tempo com Napoleão, com um vulcão e com um monstro, a partir de Frankenstein de Mary Shelley. Voltamos até ao nosso louco ano de 2025 para vermos como não se salva a Europa destruindo o modelo social europeu.
Nas nossas leituras encontrarão o Relatório Sobre a Situação dos Direitos Fundamentais: Normas e Práticas na Hungria, do qual fui relator em 2012 — afinal, não foi por falta de aviso.
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Recordo que πολύτροπον (diz-se polítropon) - "de muitos caminhos" é inteiramente gratuita. — Se quiserem saber mais sobre o nome desta carta, vejam aqui.
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Rui
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Orwell, em Budapeste e esteróides
O que anda agora a aprontar o nosso Orbán? Nos intervalos de sabotar a União Europeia a partir de dentro, e de fazer demais fretes ao Sr. Putin, ele não se esquece do seu povo. Esta semana, além de chamar a todos os húngaros que não o adoram “insetos”, avançou no seu plano muito simples para acabar com a liberdade de manifestação no país. Primeiro ponto: determinar que todas as pessoas presentes em “manifestações ilegais” possam ser filmadas e arquivadas em arquivos digitais por meio de reconhecimento facial. Segundo ponto: declarar ilegais as manifestações LGBT, a começar pela Gay Pride. Outras se lhe seguirão.
Não é preciso ser especialmente maquiavélico para ver onde isto vai levar: à criação de bases de dados de minorias, de opositores, e de outros indesejáveis. Começa a haver cada vez menos razões para ver diferenças entre os velhos fascistas e estes autocratas de agora.
E onde há diferença, uma não é de somenos: com os atuais instrumentos tecnológicos e a inteligência artificial, estes têm capacidades com que os outros só poderiam sonhar
👉 No Expresso desta semana podem ler a crónica completa
Como vai a Europa pagar a sua defesa?
Não se salva a Europa destruindo o modelo social europeu.
Mesmo assim, há investimentos iniciais que precisarão de somas mais avultadas nos primeiros anos. Tem feito debate aqui no continente as declarações do Secretário-Geral da OTAN, Mark Rutte, que sugeriu que os europeus deveriam ter de prescindir do seu estado social para investir na defesa.
Isso seria um fatal erro estratégico. Não se salva a Europa destruindo o modelo social europeu.
Em vez disso, a Europa tem outras opções.
A União Europeia pode lançar os chamados eurobonds, títulos de dívida emitidos em nome da União como um todo, e não dos seus estados-membros. A dívida da UE, bem como o seu orçamento, representam pouco mais de um por cento do PIB da União. Há espaço mais do que suficiente para emitir dívida, há interesse dos mercados globais em comprá-la, e o momento é o mais oportuno, num momento em que Trump lança a economia dos EUA na turbulência e os investidores procuram outros portos seguros.
Em segundo lugar, a União Europeia (ou apenas os estados que o desejarem) pode lançar um imposto comum de apenas dois por cento sobre fortunas acima de um milhão de euros. Nos cálculos do economista Gabriel Zucmán, isso daria mais de sessenta bilhões de euros por ano.
Em terceiro lugar, há 300 bilhões de euros em ativos russos congelados, que podem ser confiscados e usados na reconstrução da Ucrânia.
👉 Na Folha de São Paulo podem ler a crónica completa
1816: o ano sem verão que deu origem ao Frankenstein de Mary Shelley
Venham comigo dar Tempo ao Tempo ao ano de 1816 onde nos encontraremos com Napoleão Bonaparte, alterações climáticas e o monstro bom, Frankenstein, criatura de Mary Shelley que nos ajudará a aprofundar as nossas reflexões sobre o que significa ser humano.
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"Tempo ao Tempo" é um podcast de história da história; de passado, presente e futuro; da mudança da memória no tempo. Vamos percorrer a micro-história e história global, europeia e nacional e conhecer os dilemas de pessoas como nós — do passado, colocando-os em perspectivas com os nossos dilemas — pessoas do presente.
“Com o tempo, vão aparecer texturas e um padrão narrativo, que ajudará a fazer sentido do todo. Mas o todo será sempre multímodo, polifónico e eclético. De muitos caminhos.”.
Todas as quintas-feiras um novo episódio e às sextas, um episódio extra emitido na SIC Notícias (*suspenso por agora até às eleições*).
Venham comigo dar “Tempo ao Tempo”!
Podem subscrever a em expresso.pt ou ouvir na sua plataforma preferida.
E para quem perdeu o primeiro episódio,“Enquanto viveres, brilha”, que vai de Pulp Fiction a Santo Agostinho, passando por um viúvo saudoso, músicas de amor e mais, é só clicar abaixo.
Ouve “Tempo ao Tempo” nas plataformas habituais.
E acompanhem também no jornal Expresso cada episódio com um pouco da história.
Primárias do LIVRE
Terminou a primeira ronda das primárias do LIVRE para as eleições legislativas antecipadas. Parabéns aos candidatos e candidatas que passaram à segunda volta e muito obrigado a todas e todos que se candidataram!
O LIVRE cresceu quando reentrou no Parlamento e voltou a crescer quando elegeu um grupo parlamentar. Estou convicto que nas próximas eleições legislativas antecipadas, o LIVRE voltará a crescer e que esse crescimento não é fruto do acaso. É o resultado da coerência com que apresentamos as nossas ideias, da nossa coragem.
A nossa luta é por um país onde as pessoas possam viver com equilíbrio entre o trabalho e a vida familiar, onde o debate político seja feito com elevação e construtivo, e onde a solidariedade e a liberdade sejam valores fundamentais.
Nesta segunda ronda, há pessoas que pelo seu trabalho, coragem, generosidade e empenho, eu gostaria de ver no parlamento. Pessoas como a Isabel Mendes Lopes, a Patrícia Gonçalves e o Tomás Cardoso Pereira em Lisboa, o Jorge Pinto e a Filipa Pinto no Porto, o Paulo Muacho e a Geizy Fernandes em Setúbal, a Teresa Mota e o Carlos Fragoso em Braga, a Joana Filipe e o Filipe Honório em Aveiro, e muitos e muitas outras candidatas com provas dadas e percursos de grande valor.
Nos próximos dias 24 e 25 acontece a votação da segunda ronda das primárias do LIVRE!
Eleições na Madeira
No próximo domingo a Madeira vota nas eleições regionais. A Marta Sofia e o Élvio Camacho representaram com confiança e imaginação a esquerda verde e progressista na Madeira. Tenho que agradecer pela campanha inspirada nos valores democráticos e na coragem de buscar um futuro melhor. Obrigado, camaradas!
No próxima dia 23, na Madeira, o voto é LIVRE! ✊
Leituras da semana
RELATÓRIO sobre a situação dos direitos fundamentais: normas e práticas na Hungria (em conformidade com a resolução do Parlamento Europeu de 16 de fevereiro de 2012) — Rui Tavares/Parlamento Europeu (English version)
Hungria aprova lei que proíbe eventos de “Orgulho Gay” num novo golpe contra os direitos LGBTQ+ — Euro News
Hungary bans LGBTQ+ Pride marches — Toby Luckhurst
Europe: Under Protected and Over Restricted: The state of the right to protest in 21 European countries — Amnesty International
Telegram
É por aqui o meu canal no Telegram: https://t.me/ruitavarespt . Vemo-nos por lá!
Fala-me, ó musa, de um homem problemático
Sobre Emily Wilson, a mulher que se aventurou a ser a primeira a traduzir a Odisseia para inglês e o tipo de homens que se escandalizam com isso.
Mas vamos lá: chamar “complicado” a Ulisses é ou não ofensivo? E se fosse? É que a pergunta deve ir um pouco mais atrás: quem diz que é apenas suposto elogiar Ulisses na primeira linha da “Odisseia”?
Vamos à palavra tal como Homero, ou talvez “Homero”, a talvez disse primeiro e ele ou outro a escreveu depois, há cerca de entre 3000 e 2600 anos. A palavra — o primeiro adjetivo usado para descrever Ulisses na Odisseia é πολύτροπον, que se pode transcrever como “polítropon”, um acusativo de “πολύτροπος” (polítropos), para modificar o substantivo ἄνδρα, homem. Polítropon não é complicado de explicar: “poli-” quer dizer “muitos” e “tropos” que dizer “caminhos”, pelo que “polítropon” se poderia traduzir literalmente como “de muitos caminhos”. “Do homem conta-me, ó Musa, de muito caminhos” seria a tradução literal das primeiras palavras da “Odisseia”.
Leia o resto no Expresso.